revista pupa

inverno / 2022

ed. 01

Dois poemas e uma tradução

Franscesca Cricelli
A LOBA

da loba não se tem notícias
por que teria se aproximado do Tibre,
para matar a sede? 
ninguém levou água à loba
e assim sobreviveram os fundadores de Roma.
 
Cansada de amamentar seus lobinhos
saiu do santuário e desceu às margens do rio
de Rômulo e Remo conhecemos a linhagem
mas a história da origem é nebulosa
como toda origem é nebulosa
a mãe, Rea Silvia, fora estuprada por homem terreno, 
diz Tito Lívio, não seduzida pelo deus da guerra,
talvez pelo próprio tio.
 
Após dar à luz os gêmeos foi morta ou encarcerada
há controvérsias, talvez enterrada viva por descumprir o voto de castidade
nunca se sabe ao certo
como morre uma mulher
nem na fundação de Roma, nem agora.
 
A loba, anônima, vive imortalizada no bronze
em latim as palavras lupæ meretrices ambulatrices fornicatrices
indicavam o mesmo ofício
mas também noctilucæ
luz noturna 
vaga-lume


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PRECE A AUÐUMBLA1

Auðumbla das divinas tetas
deusa primeva dessa latitude 
que seus quatro rios de leite
abençoem os meus córregos
que nunca me falte a fonte
na curva noturna entre os
 meus bicos e os lábios dele.
1.Na mitologia nórdica, Auðhumbla era a vaca alimentadora, a Mãe Terra. Amamentou o deus Ímer e lambendo o sal do gelo desenterrou e deu vida a Búri. 



*
METAMORFOSE

De noite
lavo a pele de foca
a máquina

a trinta graus
e mil e duzentas rotações

o segredo é colocar óleo de fígado de bacalhau]
no compartimento do amaciante

então ela brilha que é uma beleza
sob as lâmpadas halógenas
do banheiro

enquanto isso sento-me nua
num banquinho frouxo
e fico de olho

nunca sinto-me tão viva como assim

(traduzido do islandês por Francesca Cricelli)
[HAMBRIGÐI]

Á nóttunni
þvæ ég selshaminn
í vélinni

á þrjátíu gráðum
og tólfhundruð snúningum

galdurinn er að setja lýsistöflu
í hólfið fyrir mýkingarefnið

þá glansar hann svo fallega
undir halogenljósunum
á baðinu

á meðan sit ég nakin
á völtum kolli
og fylgist með

mér finnst ég aldrei jafn lifandi

(Sunna Dís Másdóttir)
Sunna Dís Másdóttir é uma  escritora, editora e tradutora, participa do grupo de poetas e escritoras que publica coletivamente sob o nome Svikaskáld.

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Créditos:

Imagem de abertura: Jader Gadotti

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